Por: Tarcísio Paulo dos Santos Araújo
O cineasta britânico Andrew Haigh, além de alguns curtas, tem
no seu currículo filmes como “Weekend”, a série “Looking”, que mostra a vida de
três amigos gays que vivem em São Francisco, assim como o próprio filme da
série que foi lançado em 2016. Uma das características do diretor é a
capacidade de tratar as relações humanas com muita sensibilidade e
profundidade.
Com “45 Anos” não foi diferente. O longa foi entre os filmes
do diretor que mais teve destaque, contando com Charlotte Rampling concorrendo
ao Oscar na categoria de melhor atriz em 2016. Assim como em “Weekend”, Andrew
Haigh busca retratar a relações humanas a partir de momentos sutis que podem
estar numa expressão ou ação dos personagens, assim como nos bons diálogos.
No longa, Rampling interpreta Kate, uma
professora já aposentada que vive com seu marido, Geoff (Tom Courtenay). O
casal irá completar quarenta e cinco anos de casado, e se preparam para uma
festa em comemoração ao aniversário de casamento. Tudo parece ir bem até Geoff
receber uma carta avisando que o corpo de Katya, sua antiga namorada, foi
encontrado em uma geleira que derreteu. A mulher havia caído em uma fenda na
década de 60, enquanto andava por uma montanha com Geoff. O que parecia ser uma
triste e ao mesmo tempo uma notícia que não deveria afetar em nada a relação de
Geoff com Kate, traz à tona sentimentos e descobertas que estavam congelados juntos com Katya...
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“45 Anos” - Andrew Haigh |
Aos pouco o espectador observa como a relação de Geoff e Kate
é posta à prova durante o filme, através de diálogos expositivos que vão
revelando características da relação de Geoff com a falecida namorada, que
começam a despertar na ex-professora, sentimentos que a farão questionar até
que ponto seu marido casou-se com ela para tentar esquecer Katya. Não que Geoff
não ame Kate, mas é que sua reação ao saber que acharam o corpo de sua
ex-namorada, claramente o afeta muito. Ele passa a relembrar momentos que teve
com a mulher e detalhes da sua vida com ela que nunca haviam sido
compartilhados com Kate.
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“45 anos” - Andrew Haigh
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Em meio a tudo isso, Kate continua cuidando dos preparativos
do aniversário de casamento. A partir daí é como se as situações e lugares
estivessem tomados por uma atmosfera de frieza e melancolia. Ao visitar o salão
onde irá acontecer a festa, Kate aparece andando pelo lugar vazio e nota uma
parede que parece estar faltando algum quadro. Coincidência ou não, mais
adiante descobrimos que o casal não tem fotos juntos nos momentos mais
significativos de suas vidas.
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“45 anos” - Andrew Haigh
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O desenrolar da história que acontece durante o outono, traz
mais reforço para a personagem que parece “desvanecer” aos poucos. Às vezes a
vemos diminuída andando por um campo enquanto procura o cachorro. A vegetação
apresenta uma neblina e a fotografia traz uma paleta de cores meio azulada que
parecem retratar a mulher como uma lembrança, algo que não é vívido na memória,
mesmo ela estando casada com Geoff há 45 anos. O mesmo ocorre na direção de
arte. Katy costuma usar um casaco branco que em determinados lugares onde ela é
enquadrada, faz com que a personagem se “funda” com a paisagem ou com o que
está atrás dela. Mesmo em dias ensolarados, as folhas secas e o vento reforçam
essas ideias.
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“45 anos” - Andrew Haigh
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“45 anos” - Andrew Haigh
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No final, já no dia da festa, o roteiro de “45 Anos” evita um
final clássico e direto, se concentrando mais nos sentimentos de Kate e uma
possível decisão da personagem com relação ao seu casamento, é retratada
através do semblante da personagem que é tomada por uma luz azul enquanto toca
“Smoke Gets In Your Eyes” dos The Platters, cuja letra da canção reforma mais
os sentimentos de Kate.
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