Por: Tarcísio Paulo Dos Santos Araújo
“Esta é uma história relatada por um homem louco, e
apresentada da forma como os acontecimentos foram registrados em sua mente
distorcida”.
Assim se inicia o primeiro intertítulo do curta “O Coração
Delator” (The Tell-Tale Heart, 1928), curta metragem mudo dirigido por Charles
Klein e Leon Shamroy (não creditado), adaptado do conto homônimo de Edgar Allan
Poe. Com adaptações mais conhecidas do público como “O Corvo” e “A Queda da
Casa de Usher” (que por sinal também conta com uma adaptação muda, realizada
também em 1928 na França, por Jean Epstein), vale a pena conhecer mais essa que
se encontra no Youtube. Mesmo sem legendas em português para os intertítulos,
quem já conhece o conto e por conta do próprio cinema mudo ser um cinema que privilegia
o contar histórias através das imagens, não fica difícil de compreender a
narrativa.
Como o próprio intertítulo mencionado acima nos avisa, temos
toda a narrativa do ponto de vista do protagonista, cuja mente está distorcida.
O homem planeja matar um senhor que dorme no quarto, cujo olho perturba o
protagonista de tal forma, que ele prefere se livrar do pobre senhor.
O curta não poderia ter deixado de lado o estilo que mais
acolheria a sinopse do conto: o expressionismo alemão. O expressionismo alemão
surgiu primeiro nas artes plásticas para só depois chegar ao cinema. Grande
precursor do cinema de horror, esse estilo surgiu na Alemanha com o filme “O
Gabinete do Dr. Caligari” de 1920.
Conhecido por externar os sentimentos e sensações dos personagens
através dos cenários e das expressões dos atores, temos assim a representação
de uma realidade que não busca ser objetiva.
E é exatamente isso o que podemos notar ao ver o curta. O uso
de sombras distorcidas e uma expressão de angústia e loucura do personagem
principal marcam o visual da narrativa, que também faz o uso de uma fotografia
que privilegia pouca luz, mesmo porque parte da história se passa à noite
quando a vítima do homem insano está dormindo.
Passado inteiro dentro de um quarto, a fotografia também
consegue diminuir a sensação de espaço do lugar com a escuridão, como forma de
representar uma mente encurralada e tomada pelas sombras, com poucas chances de
se iluminar. Quando conseguimos ter uma ideia melhor do quarto, já é de dia. A chegada
dos detetives reforça o momento como um vislumbre de realidade, porém sem nunca deixar de representar o psicológico do
protagonista nas portas, janelas e formas dos cenários completamente disformes.
Se o conto de Edgar Allan Poe consegue mergulhar fundo na
insanidade de seu personagem, o filme faz uma interessante representação do
conto ao usar o expressionismo alemão (embora o filme seja americano) como
forma de alcançar o mesmo efeito no cinema. Vale a pena conferir.
Abaixo link para conferir o curta no youtube
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