segunda-feira, 30 de janeiro de 2017

“Trabalhar Cansa”

Dificuldades de se começar um novo empreendimento ganham elementos do cinema fantástico em “Trabalhar Cansa”.

Texto de: Tarcísio Paulo Dos Santos Araújo

Parceiros em diversos curtas-metragens, o primeiro longa-metragem da dupla Marco Dutra e Juliana Rojas, foi exibido em Cannes, na mostra “Um Certo Olhar” em 2011. A aproximação da dupla com um universo voltado para o estranho e para o fantástico já esteve presente em curtas como “Lençol Branco” (2004) e “Um Ramo” (2007), que podem ser conferidos no Youtube.

No longa, Helena (Helena Albergaria) está prestes a dar um importante passo: abrir um minimercado, se tornando assim mais uma brasileira a realizar o sonho de ter o próprio negócio. Porém, quando tudo está encaminhado, Otávio (Marat Descartes), seu marido, perde o emprego. Decididos mesmo assim a prosseguir com o sonho, a relação da família será colocada à prova diante das dificuldades que terão que enfrentar e de estranhos acontecimentos que tomarão conta do local.



Mesmo com uma sinopse que vende o filme como sendo do gênero do terror, é preciso esclarecer que o longa não se trata de um filme mais convencional como estamos mais acostumados a ver. “Trabalhar Cansa” tem uma narrativa um pouco mais lenta, com situações que evocam uma estranheza e sensação de que algo está errado. E não é para menos.

A narrativa vai fundo na dificuldade enfrentada pelo casal e na tentativa de se erguer e fazer dá certo o minimercado aberto por Helena. Para isso, não faltam problemas de ordem natural como funcionário que rouba mercadoria e clientes pouco simpáticos que reclamam dos preços. Mas além disso, e por se tratar de um filme que usa elementos do fantástico, claro que também existem os elementos utilizados de forma muito eficaz para retratar essa crise vivida pelo casal que se dá através de fatos estranhos. Podemos conferir isso no cachorro que late para Helena sem motivo aparente, quando a mesma fecha o estabelecimento todas as noites ao ir para casa, ou até no cheiro ruim que surge 
no mercado durante o dia.



Há ainda espaço para a discussão da importância do registro das empregadas domésticas, uma vez que a moça contratada para trabalhar na casa da Helena, acaba se sujeitando a trabalhar sem registro por não ter ainda experiência e pela necessidade do trabalho. Não que Helena seja uma pessoa que não saiba a importância do registro e que não queira registrar a moça, mas porque o filme deixa bem claro ambas as situações difíceis enfrentadas pelas personagens no momento.

Tudo isso nos é mostrado através de uma fotografia com tons acinzentados que reforçam uma sensação de pessimismo e incerteza do futuro de Helena com relação a sua tentativa de ter o próprio negócio.
Além disso temos um monstro. Seria ele um monstro qualquer que resolveu se infiltrar nas paredes do mercado, ou seria ele a representação de algo mais? Independentemente do que seja, vemos como Helena e Otávio precisam enfrentar juntos essa crise que assola os primeiros meses do novo investimento, de uma forma que exorcize todos os seus problemas para poderem seguir em frente. E é no monstro que encontramos exatamente essa catarse no final que simboliza a superação de uma crise.







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