Texto de: Tarcísio Paulo Dos Santos Araújo
“Monstros” é um dos filmes mais à frente de seu
tempo que foram produzidos. Estamos falando de uma produção de grande estúdio
no ano de 1932, que apresenta personagens com os mais diferentes tipos de
deficiência e que ao mesmo, têm extrema importância na história. Tudo isso
ainda dando espaço para a sensibilidade e o respeito, mas também dando voz a
esses personagens que contavam com alguns atores que realmente apresentavam
deformidades e trabalhavam no circo.
A história se passa em um circo itinerante
repleto de palhaços, acrobatas e “aberrações”. Hans (Harry Earles) é um homem
portador de nanismo que acaba de herdar uma fortuna. A trapezista Cleópatra
(Olga Blacanova), tenta arruinar a relação dele com sua noiva, Frieda (Daisy
Earles), ao mesmo tempo em que tem um caso com Hércules (Henry Victor), o
Homem-Músculos da trupe. Depois de uma tentativa de assassinato que sai errado,
boa parte dos membros do circo executam um plano de vingança que resulta em uma
das melhores sequências do longa.
Claro que na época, a divulgação do filme tinha
que ter em seu apelo. Frases como “A mais assustadora história de terror sobre
os anormais e indesejáveis”, eram comuns de serem vistas como forma de atrair o
público. A intenção da MGM era clara desde o início do projeto: “Quero que
façam algo mais apavorante do que Frankenstein”, teria dito o executivo do
estúdio Irving Thalberg aos diretores, ciente do sucesso que a Universal
acabara de conseguir com “Frankenstein”.
Tod Browning, diretor de “Monstros”, havia dirigido
“Drácula” para a Universal e embora tivesse uma mórbida sensibilidade, tinha
uma relação forte e clara de empatia com seus personagens. Isso é refletido na
obra, uma vez que consegue criar uma atmosfera sombria e ao mesmo tempo
sensibilizar o espectador, fazendo-o se pôr no lugar dos personagens. Isso é
muito importante, pois se o marketing para o filme fez um certo sensacionalismo
com as deformidades dos personagens, ao conferir a obra, o espectador perceberá
que as coisas não são exatamente o que parecem. Será que nós, considerados
“normais”, não seríamos na verdade os verdadeiros monstros?
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Tod Browning dirigindo Olga
Baclanova
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Não é preciso dizer que o filme chocou o
público na época, que o considerou violento demais. O longa precisou ser
editado drasticamente, e mesmo assim foi hostilizado por boa parte do público.
No Reino Unido, a produção foi banida por trinta dias depois do lançamento,
além de ser banido totalmente na Austrália. “Monstros” também teve suas
polêmicas na produção. Os maiores astros da MGM não quiseram se envolver com o
projeto, e Myrna Loy (originalmente escalada como Cleópatra), implorou aos chefes
do estúdio para que a dispensassem do papel.
Browning colocou muito de suas próprias
experiências em “Monstros”. Nascido em uma família rica, o cineasta largou tudo
para viver em um circo. Lá ele ficou amigo de D. W. Griffith e decidiu seguir a
carreira no cinema. Com “Intolerância” (D. W. Griffith, 1916), Browning viu a
chance de começar na sétima arte pela atuação. Um ano depois já estava
dirigindo seus próprios filmes. Conhecido como o Edgard Allan Poe do cinema, o
diretor sempre teve afinidades com o macabro e com o sinistro. A parceira com
Lon Chaney, conhecido como “o homem das mil faces” (pela criatividade em compor
suas próprias maquiagem nos filmes), deu super certo em filmes como “A Trindade
Maldita” (1925), “Londres Depois da Meia-noite” (1927) e “No Oeste de Zanzibar”
(1928). Durante a pré-produção de “Dracula” (1931), Browning se viu pego de
surpresa com a morte repentina de Chaney, fazendo com que o diretor contratasse
então, Bela Lugosi, que se tornaria posteriormente o vampiro mais conhecido do
cinema. Os últimos trabalhos de Tod Browning foram nos filmes “A Marca do
Vampiro” (1935), “A Boneca do Diabo” (1936) e “O Vendedor de Milagres” (1939).
Já “Monstros”, só consegiu o status de cult na
década de 60, por conta da chegada da contracultura. Independente das
polêmicas, que hoje já não chocam mais, o longa merece ser visto por sua
ousadia, genialidade e por ser muito bem realizado.
Vale lembrar que para os fãs da série
“American Horror Story”, em especial a 4ª temporada (Freakshow), as referências
do filme são facilmente reconhecidas na série. Se você gostou da 4ª temporada,
vá correndo ver “Monstros”!
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