quarta-feira, 5 de julho de 2017

Impressionismo Francês e um dos primeiros filmes feministas do cinema

Texto de: Tarcísio Paulo Dos Santos Araújo 

Após a Primeira Guerra Mundial, o cinema francês foi muito prejudicado. Com dois grandes estúdios (Pathé e Gaumont) controlando o circuito, a França também se viu dominada por produções americanas que ganhavam cada vez mais o público, fazendo com que os franceses assistissem oito vezes mais filmes hollywoodianos do que a filmes franceses. Isso fez com que as produções francesas começassem a imitar os gêneros e métodos das produções americanas. 


Mas eis que surgem um novo grupo de diretores que resolveu ir contra à produção de filmes comerciais. Abel Gance, Louis Delluc, Germaine Dulac, Marcel L’Herbier e Jean Epstein, eram completamente diferentes de sua geração anterior de cineastas, e através de diversos ensaios, proclamavam que o cinema é uma arte comparável a poesia, pintura, música e literatura. Eles defendiam também que a sétima arte deveria ser algo puro, existindo por si só e não uma arte que simplesmente derivou da literatura e do teatro. 

Germaine Dulac

Entre 1918 e 1928, surge uma série de filmes que davam às narrativas uma profundidade psicológica. Havia uma tentativa em capturar a percepção do mundo real de seus personagens através de fortes elementos visuais que caracterizavam tal entendimento desse mundo. Esses novos cineastas eram influenciados pela pintura impressionista de Claude Monet e Camille Pissarro, e pela literatura de Charles Baudelaire.

Entre filmes como “A Roda” (La Rou, 1923) e “Napoleão” (Napoleón, 1927), “A Sorridente Senhora Beudet (La souriante Madame Beudet, 1923), foi dirigido por Germaine Dulac e é considerado um dos primeiros filmes feministas da história do cinema. A sinopse é simples: uma mulher casada com um empresário do ramo têxtil, se sente entediada com seu casamento monótono, uma vez que seu marido parece pouco se importar com ela. Mesmo com uma narrativa simples e poucas reviravoltas, Dulac manipula o tempo em favor da personagem que fica constantemente dentro de casa enquanto as horas passam. 


Seus sentimentos e desejos são levados em total consideração pela cineasta, criando cenas bem interessantes. Distorções simbolizam a raiva de Beudet, enquanto que uma gaze colocada na frente da lente da câmera, faz com que a protagonista ganhe um ar de sonhadora. Uma imagem em câmera lenta, também ganha outro status na narrativa, ao retratar os devaneios da mulher. Tudo isso era para colocar o público no lugar da protagonista. Vale citar que o movimento impressionista francês, também abarcava as ideias de Sigmund Freud para dentro do cinema. Em “A Sorridente Senhora Beudet”, temos uma elevação do sentir da personagem que se sobrepõe à uma narrativa de simples acontecimentos e ações. Germaine consegue dar voz e uma atenção psicológica à uma personagem feminina. Isso talvez explique como o cinema francês se destaca tão bem na forma como constrói seus personagens.


Quanto ao movimento impressionista francês, seus filmes começaram a ter um gasto cada vez mais alto (como “Napoleão” que com um enorme orçamento, fez com que o diretor Abel Gance perdesse sua independência), assim como essa forma de representar o olhar do personagem através do olhar do público, teria se tornado algo fugaz para o espectador. Essa forma inovadora e cheia de experimentos acabou também por desinteressar o público mais de massa e caiu no gosto apenas da elite francesa. Outro fator que ajudou no declínio do movimento, foi a chegada do som, que fez com que os gastos fossem todos para a grande novidade do momento, fazendo com que estúdios investissem cada vez menos nos filmes impressionistas.

Mesmo assim, o legado deixado por esses jovens cineastas influenciou o cinema pelo mundo, como nos trabalhos de Hitchcock e Maya Deren. O cinema soviético também mostrou interesse pelo movimento, em especial o cinema de Eisenstein, que fazia uso de movimentos acelerados em seus filmes, que também se originaram do impressionismo francês. O mesmo acorreu com os clipes musicais na década de 80, cuja movimentação acelerada também pode ser notada.      


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