Texto de: Tarcísio Paulo Dos Santos Araújo
Quando o filme “Os Olhos Sem Rosto” (1960) foi
lançado, os críticos na época se dividiram e muitos não ficaram satisfeitos com
o resultado. Houve preconceito primeiramente com o próprio gênero do horror e
algumas resenhas apontaram o “mal gosto” do diretor Georges Franju, que
acostumado a trazer uma crítica social em seus filmes, acabou fazendo um filme
de um gênero não muito respeitado pela crítica na época. Franju defendeu sua
obra alegando que queria justamente fazer com que esse gênero que é pouco
levado a sério, fosse um pouco mais respeitado. Anos depois, agora com o status
de clássico do cinema de horror, é evidente que o cineasta conseguiu o que
queria.
E é com esse enredo que poderia facilmente se
transformar em um filme de terror, que retratasse as experiências do Dr.
Génessier como as de um clássico cientista maluco, que podemos perceber que o
longa opta por um caminho diversificado. Primeiramente “Os Olhos Sem Rosto”
consegue capturar a humanidade de seus personagens, independente de seus atos. Temos
um pai desesperado e ao mesmo tempo se sentindo culpado pelo acidente da filha
(ele quem dirigia o carro na hora), ao mesmo tempo em que está ciente de suas
atrocidades, mas que ainda assim necessita
fazer suas experiências para ajudar Christiane.
Louise também está dividida entre ajudar o médico, uma vez que ele também a
ajudou ao reconstruir seu rosto sem deixar quase nenhuma cicatriz, e a culpa em
ser a responsável por atrair as jovens mulheres até a casa do médico, com a
promessa de mostrar um quarto de aluguel.
Christiane ainda mostra seu carinho com os
animais. Seu pai mantém diversos cães presos para usá-los posteriormente em
mais experiências com enxerto de pele. Em uma dessas visitas, a jovem começa a
fazer carinho nos cães que parecem demostrar também um certo afeto com a
personagem, diferente do seu pai que sempre evoca o latido dos animais com sua
presença. Em uma cena, vemos Christiane “enclausurada” em uma jaula quando a
câmera fica por dentro da mesma, dando a impressão da personagem estar presa.
Mais uma vez o tema principal do filme (liberdade) é evocado
através do visual.
Uma das cenas de destaque, é a cena da cirurgia
em que é mostrada a retirada da pele de uma das vítimas do médico e sua
assistente. A aflição que a cena evoca ao mostrar o bisturi cortando a pele por
baixo, fez alguém na plateia desmaiar na época em que o filme foi lançado e até
hoje pode causar desconforto em algumas pessoas. Mesmo que Franju não opte por
uma abordagem da cena digna de um filme trash (no bom sentido) dos anos 80, ela
tem uma elegância que consegue ao mesmo tempo impressionar, mesmo sem ser
apelativa e sanguinolenta.
Todos esses aspectos ainda são capturados com
a excelente fotografia de Eugen Schüfftan.
Nascido na Alemanha, Eugen foi um grande estudioso do expressionismo alemão
e responsável pela criação da técnica chamada de Processo Schüfftan, que
consistia em inserir a imagem dos atores com cenários em miniatura, dando a
impressão de ambos serem uma coisa só no plano. O processo foi primeiramente
usado no filme Metrópolis (1927), dirigido por Fritz Lang. A técnica viria a
ser depois sucedida pelas "pinturas/projeções de fundo" e o chroma
key.
E nessa poesia cheia de horror sobre ser
livre, que percebemos como Georges Granju estava certo ao fazer um filme que
buscasse trazer seriedade a um gênero que com raras exceções consegue trazer
profundidade e temas relevantes em seu enredo.
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