Dirigido por Peter Weir (Sociedade dos Poetas Mortos, O Show de Truman), Picnic na Montanha Misteriosa (Picnic at Hanging Rock, 1975) é uma adaptação feita por Cliff Green do livro homônimo escrito por Joan Lindsay. Propositalmente ambíguo na grande questão sobre o que teria acontecido as personagens, Lindsay nunca foi clara em relação se os eventos ocorridos são baseados em histórias reais.
Em 14 de fevereiro de
1900, dia de São Valentin, um grupo de alunas do colégio Appleyard College
saem para um passeio até a Hanging Rock, uma formação rochosa de origem
vulcânica. Após um piquenique, um grupo de alunas, acompanhadas de uma
professora, resolve explorar a rocha mais de perto até que ao entrarem em uma
fenda, desaparecem misteriosamente.
Com essa sinopse
convidativa e os dizeres a cima que surgem na tela antes da primeira imagem do
filme, Picnic na Montanha Misteriosa teria
tudo para ser mais um filme de mistério, cuja investigação minuciosa levaria a
uma descoberta espantosa e quem sabe até trágica. Mas não se engane. Um dos
grandes trunfos desse filme australiano, é atmosfera única e hipnotizante, que
facilmente nos prende.
O primeiro ato que
antecede o conflito, é usado para criar uma ambientação onírica logo quando as
alunas acordam e se arrumam para o passeio. A felicidade das personagens,
juntamente com a música, também evocam essa sensação quase que fora da
realidade.
“Uma história de fantasma
sem os fantasmas, um enigma sem solução e uma história de repressão sexual, sem
sexo”. Assim é definido o filme na primeira linha do texto escrito por Joshua
Klein, que está na edição de 2016 do livro 1001
Movies You Must See Before You Die (1001
Filmes Para Ver Antes de Morrer). Se você se pergunta a razão de assistir a
um filme em que pouco será revelado para o espectador, a razão é simplesmente
que poucos filmes conseguem ser bem realizados e afetar seu público justamente
com aquilo que não se pode ver ou entender.
Do ponto de vista
temático, essas meninas que desaparecem após passarem por uma fresta da rocha,
pode ser entendido como justamente a passagem da inocência para a maturidade,
ou até mesmo uma quebra da repressão sexual, caminho esse que não tem mais
volta. Mas como esse momento chega para todos em momentos diferentes, temos em
apenas quatro personagens (três, porque uma das alunas é depois encontrada) como
as “escolhidas” para terem essa experiência.
Falando em experiência,
nós também a sentimos graças a direção de Weir. Na montanha a atmosfera onírica
se eleva quando as personagens, em especial as alunas que irão desaparecer,
estão em contato com o lugar. A própria natureza ali presente é evocada e
parece tomar conta das personagens, como se as mesmas estivessem em um transe.
A fotografia (que contou com um véu por cima da lente da câmera), reforça ainda
mais esse clima etéreo que hipnotiza até mesmo o espectador.
A personagem de Edith (Christine
Schuler) é a única no grupo que não entre na fenda da pedra. Assustada, ela
constantemente diz que quer ir embora e mostra não estar bem ali. Poderia essa
reação da personagem representar o medo que às vezes podemos ter de amadurecer?
Edith enxerga a rocha desde o início como algo ameaçador, que não acabará bem,
enquanto as alunas e a professora nem se quer parecem se importar. Pelo
contrário. Um momento de entrega se dá quando “as escolhidas” tiram suas meias
e ficam descalças. Contato esse que frisa a ideia de que elas estão de fato
preparadas para aquele momento. Irma (Karen Robson) no entanto, é encontrada
depois de um tempo. Teria a personagem “desistido” de ir com as colegas no
último momento, por ainda não se sentir preparada?
Teorias e teorias. Assim
é Picnic na Montanha Misteriosa, um
filme capaz de nos deixar pensando durante horas sobre interpretações diversas
para os eventos ocorridos e que nos fará analisar e provavelmente rever o
filme, para que possamos notar algo que tenha passado batido. Com uma história
que se mostra mais eficiente justamente por não trazer respostas, o longa
cumpre o seu papel ao fazer parte de um cinema que busca nos fazer questionar.
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