quinta-feira, 27 de abril de 2017

"Girlboss" análise da Primeira Temporada

Texto de : Danatielly Costa

Para falar sobre a nova série da Netflix "Girlboss" criada por Kay Cannon, primeiro é necessário saber que a série é baseada no livro homônimo da empresaria Sophia Amoruso, fundadora da loja on-line Nasty Gal. A série se passa em meados dos anos 2000 e conta a trajetória da de Sophia antes de ser a conhecida como a mulher de sucesso no mundo dos negócios, e como tudo começou.

Mas se você pensa que a série vai ter a pegada do universo business, ou a ideia da autoajuda, em torno da trajetória de uma pessoa que veio do nada e alcançou o sucesso, não é bem assim que as coisas são.Os produtores resolveram recriar a história de Sophia, aproveitando bem o formato audiovisual com as novas características de produção em plataforma on demand, da para perceber que é um projeto levado a sério em vários aspectos.



Já que ela retrata a vida de jovens mulheres sonhadoras percebe-se um lance meio “Girls” da HBO, que teve a ultima temporada exibida esse ano, os fãs que estavam órfãos podem considerar Girlboss como uma boa alternativa. A série fala do universo feminino sem estereótipos com muito realismo, explorando os dramas vividos pelas mulheres dessa geração, com uma pegada de bom humor e na medida certa, assim como Girls, e "Love" outra série do catalogo da Netflix , que trazem para o universo das séries uma nova forma de produção estilo “filmes independente” para falar sobre os jovens adultos, sendo ousado com estilo próprio, o que parece ter se tornado uma formula de sucesso, se não daqueles arrasadores, das que conseguem muito dialogo com um nicho especifico reforçando uma ideia de um movimento audiovisual que vem ganhando força no cinema mundial, que traz sempre muitos elementos de referência do próprio universo cinematográfico, e da cultura pop.

Dito isso, a série é uma dessas com personagens bem construídos e bem defendidos com boas atuações, daqueles que a gente acaba amando, porque temos empatia por essas pessoas que facilmente poderia ser qualquer um de nós no dia a dia, esse é o caso da Sophia Marlowe, interpretada pela atriz Britt Robertson, a personagem que já sabemos que sim existe na vida real. Ela é muito engraçada e excêntrica, o que nos leva a pensar “Meu Deus será que essa mulher é assim mesmo?”, Tudo gira em torno dessa garota que decide abrir a própria empresa porque não queria ter um "emprego formal" com medo de se tornar uma adulta responsável com uma vida chata. Super dá para entender.

Aos poucos vamos vendo a empresa de Sophia ganhar forma, mas essa é só uma faceta da série, pois ela parece abordar mesmo é o crescimento da protagonista e seu amadurecimento pessoal, e como seus sonhos e vontades afetam sua vida, e as vidas das pessoas a seu redor.

Um grande trunfo de Girlboss é a montagem, que consegue de forma dinâmica e interessante representar a subjetividade dos personagens, como a série aborda questões de sonhos e ambições, a fantasia da cabeça das personagens é representada através de devaneios, que são apresentados de forma muito criativa. Como a série explora o universo da geração que deu o bum inicial nos negócios online, ela não para apenas nos grafismos na tela exibindo telas de bate papo de Smartphone, o que todo mundo já fez quando se trata desse tipo de abordagem, conseguindo explorar de forma artística construindo um ambiente que representa bem como as coisas funcionam em uma conversa online, em alguns trechos temos os personagens conversando em um fundo branco ou preto cara a cara, quando na verdade estão teclando em seus computadores separadamente.

"Girlboss" Netflix

"Girlboss" Netflix

Essa forma de mostrar esses diálogos nos chama a atenção para a realidade do universo da internet que por vezes é esquecido ou banalizado por nós que facilmente esquecemos que sempre tem seres humanos atrás de cada comentário online na internet.

A série é regada com uma trilha sonora muito boa com musicas estilo pós-punk e pós-grunge o que ajuda a ambientar esse momento da cultura pop e da nova cultura de negócios, que trazem elementos de rebeldia e contracultura para a trama, já que Sophia está desafiando o sistema quando resolve sendo uma garota sem dinheiro estudo, abandonar os trabalhos medíocres para ter seu próprio negócio. 

"Girlboss" Netflix

E nas referências a série trás elementos do cinema mais recente com a mesma atmosfera como o “Antes do amanhecer” 1995 de Richard Linklater, e da série The O.C. exibida de 2003 a 2007.

“Antes do amanhecer” 1995 de Richard Linklater













“Antes do amanhecer” 1995 de Richard Linklater


























Girlboss é super necessária no momento, porque consegue colocar em destaque o poder feminino sem ser panfletista, apenas dando espaço para falar de mulheres em todos os espaços sociais, assuntos que ainda são considerados tabus como a sexualidade feminina é discutido abertamente e sem rodeios, além de desconstruir a ideia que foi sempre mantida na sociedade contemporânea que "mulheres são concorrentes e não podem ser parceiras" ou se organizarem em torno de um bem comum como por exemplo abrir uma empresa, já que Sophia está sempre contando com o apoio de sua melhor amiga Annie (Ellie Reed), em todos os momentos, e juntas desafiam uma estrutura que ainda é dominada por homens. 

"Girlboss" Netflix

"Girlboss" Netflix

Vale apena destacar que a série é produzida pela atriz Charlize Theron e também pela própria Sophia Amoruso, além de contar com várias outras mulheres na produção.


sábado, 22 de abril de 2017

Lake Mungo

Texto de : Tarcísio Paulo dos Santos


A Austrália parece ser um país que sabe produzir filmes de terror bem interessantes. Produções como “O Babadook” (2014) e “Entes Queridos” (2009), são dois bons exemplos de filmes desse gênero que merecem ser conferidos por qualquer fã de terror. Além desses dois, outro filme, pouco conhecido, também chama a atenção: “Lake Mungo” (2008).


Esse falso documentário foi dirigido por Joel Anderson, que infelizmente parece ter desaparecido do mundo do cinema, sendo que esse foi seu único longa-metragem até o momento. O cineasta conta apenas com a direção de um curta-metragem chamado “The Rotting Woman”, produzido em 2002. 


O longa conta a história de uma família australiana cuja filha, Alice Palmer (Talia Zucker) faleceu após aparentemente se afogar em um lago durante uma viagem com seus pais, Russel Palmer (David Pledger) e June Palmer (Rosie Traynor), e seu irmão Mathew (Martin Sharpe).

A partir daí somos conduzidos a entrevistas, imagens de arquivo, filmagens caseiras e atuações convincentes que vão nos mostrando um pouco sobre a família, o processo de luto e o que teria acontecido com Alice. Sem ser um filme que busca algum tipo de investigação específica sobre a morte da jovem, “Lake Mungo” explora mais os mistérios que ocorrem após a morte de Alice, ao mesmo tempo em que equilibra thriller, terror e drama familiar, dando espaço também para aspectos da relação de Alice com sua mãe e até mesmo a falta de comunicação entre a família. Esse já é um dos grandes diferenciais, já que seria mais fácil focar apenas em supostas aparições da garota na casa através de sustos fáceis, ou da famosa câmera na mão que acompanha tudo como no subgênero do terror, “found footage”. Poucos filmes de terror conseguem explorar bem seus personagens, mas justamente por inserir também o elemento dramático, o roteiro de “Lake Mungo” consegue ter seu diferencial.


Na verdade, esse clichê do espírito captado na câmera, mesmo que apareça no filme, logo ganha uma reviravolta que é totalmente justificável, tendo a ver como o irmão de Alice reagiu com a perda da irmã. Ainda que depois que a presença se mostre real, esse elemento nunca se mostra over ou tenta aparecer um mero artifício para assustar o espectador. 


Além disso, as imagens do falso documentário que servem para ilustrar o drama da família, variam desde imagens da casa do lado de fora com uma luz que pisca na sala, a luz da varanda que está sempre acessa, como forma de sugerir que Alice ainda está por ali até em imagens do pôr do sol que sugerem esta ideia da vida que se desvanece. Imagens do quarto de Alice também são bem eficientes, pois são usadas em momentos em que os personagens falam da garota e de como sentem ainda sua presença. Isso realça de forma eficaz a sensação de algo possa surgir a qualquer momento na cena. Tudo isso ajuda a compor de certa forma, uma poesia visual em torno de Alice e o impacto de sua morte e presença.



Como se não bastasse, a terceira reviravolta no filme deixa tudo ainda mais estranho e perturbador, sem a pretensão de nos dar uma resposta pronta sobre o que teria acontecido com Alice durante uma viagem feita um pouco antes de seu falecimento. As imagens feitas por ela através de seu celular, são um dos pontos altos da narrativa, nos causando medo e até uma reflexão do que teria acontecido.

Independente da conclusão do espectador, “Lake Mungo” consegue trabalhar conflitos internos de seus personagens, problemas pela falta de diálogo em família e o conflito que causa o medo (presença de Alice) não como uma ameaça, mas como uma forma da própria família alcançar uma paz de espírito para poder seguir em frente, além de dosar o gênero do terror com elementos dramáticos.



quinta-feira, 13 de abril de 2017

Sangue de Pantera

Texto : Tarcísio Paulo Dos Santos 

Sucesso de bilheteria, mas nem tanto de crítica, “Sangue de Pantera” (Cat People) ficou por muito tempo nos cinemas quando foi lançado em 1942. Isso permitiu que os críticos pudessem rever o filme e assim perceber que haviam sido severos demais na avaliação. Com o passar dos anos o longa dirigido por Jacques Tourneur e produzido por Val Lewton ganhou status de filme cult e virou um grande clássico do horror, circulando por diversas listas como na de “1001 Filmes Para Ver Antes de Morrer” de Steven Schneider.


Vale a pena comentar sobre a importância de Lewton para o cinema de horror. Se a Universal já dominava esse gênero na década de 30 com clássicos como “Frankenstein” e “Drácula”, ambos de 1931, a RKO Pictures se destacava com filmes que produzidos por Lewton, eram capazes de criar boas histórias com um orçamento apertadíssimo. Os diretores da RKO faziam filmes em que o espectador podia conferir uma atmosfera sugestiva, mantendo muitas vezes o monstro escondido do público e disfarçando elementos dos cenários com sombras. 


“Sangue de Pantera” conta a história de Irene Dubrovna (Simone Simons), nascida na Sérvia e recém-chegada aos Estados Unidos. Sozinha e sem amigos, a jovem trabalha fazendo desenhos de moda até que um dia conhece Oliver Reed (Kent Smith), que trabalha em um escritório de arquitetura. Os dois se apaixonam rapidamente, porém uma maldição impede que a relação do casal alcance um grau maior de intimidade. Irena é assombrada por um conto de seu país que narra a lenda de como as pessoas de sua aldeia (em sua maioria bruxas e adoradores do diabo) teriam a capacidade de se transformarem em panteras quando se veem tomadas por fortes emoções, como raiva, ciúmes e excitação.

O filme traz muito elementos visuais que reafirmam a conexão da protagonista com a possível maldição e com a impossibilidade de sua relação com Oliver ter futuro. Mesmo causando intimidação aos animais, a protagonista gosta de ficar no zoológico da cidade, especialmente perto da jaula de uma pantera que vive enjaulada no lugar. O encontro com Oliver acontece justamente nesse local, onde a jovem faz um desenho do animal e acaba rasgando por não acreditar que tenha ficado bom. O vento faz com que as partes da ilustração se unam novamente, formando o desenho da fera.


Mesmo Oliver sabendo da maldição, ele não acredita em Irene. A mulher por outro lado se vê constantemente angustiada e oprimida, como quem está constantemente se policiando para esconder algo. Isso é refletido nas sombras que aparecem em seu apartamento com muita frequência durante o filme. Oliver tem o papel de algumas vezes abrir cortinas ou acender o abajur, como que uma tentativa de trazer luz para a vida de sua noiva. A própria personagem diz preferir a escuridão ao dizer: “Eu gosto da escuridão, é amigável". Os sons vindos do zoológico e que podem ser ouvidos do apartamento de Irene também não a incomodam, resultando em como todos esses elementos parecem fazer parte da natureza da personagem.


Outros fatores que sutilmente mostram a dificuldade do casal podem ser conferida em alguns enquadramentos em que ambos ficam separados, como em uma cena em que uma porta divide Irene e Oliver ou quando um biombo também parecer dividi-los. 


A morte do pássaro que foi dado de presente a Irene por Oliver e o gato que se esquiva da protagonista vão reforçando mais a maldição que parece impregnar a mulher. Até o próprio figurino da personagem tem um peso nisso. Irene usa várias vezes durante o filme, um casaco preto que a faz parecer uma pantera negra, como a vista na jaula do zoológico, assim como as sacadas do prédio onde vive parecerem grades que a “enjaulam”. 

Chega o momento em que a narrativa coloca a situação de Irene através do lado mais racional. A protagonista passa a buscar ajuda médica para o seu problema em não conseguir se relacionar intimamente com Oliver, acreditando estar amaldiçoada. Ciência e sobrenatural são colocados frente a frente, porém o Dr. Louis Judd (Tom Conway) sente que Irene não está sendo 100% franca com ele, o que estaria prejudicando seu tratamento. Além disso, a personagem resolve que frequentar mais às sessões do Dr. Judd, escondendo o fato de Oliver.

A narrativa de “Sangue de Pantera” fica ainda mais interessante com a introdução do suspense, que é um dos pontos altos do filme. Com Irene se tornando uma pessoa cada vez mais ciumenta e incomodada com a amizade de Oliver e Alice Moore (Jane Randolph), melhor amiga e colega de trabalho de seu noivo, a narrativa ganha contornos de horror e suspense quando Alice passa a ser seguida por Irene, criando um desconforto psicológico para a personagem e para o próprio público.

Na rua a mulher está indo em direção ao ponto de ônibus enquanto sente que está sendo seguida. Planos detalhe dos pés de Irene e Alice vão sendo intercalados enquanto a cena nos é apresentada sem música, valorizando apenas o silêncio e os sons de passos de ambas as personagens. A suspensão do tempo também é importantíssima nessa cena, que prolonga um possível ataque que poderá ser sofrido por Alice. Sem esperarmos, tanto nós quanto a personagem, o som do ônibus (parecido com o de uma pantera rugindo) freia para que Alice possa subir nele. Essa técnica de criar uma tensão de forma lenta para no final um susto nos fazer pensar que algo ruim irá acontecer, foi batizada de “Lewton Bus”, levando o nome do produtor do filme e sendo usada posteriormente em diversos outros filmes.  



Com pouco fôlego depois dessa cena, logo estamos diante de outra cena que também é eficaz na construção do suspense. Alice dessa vez está na piscina quando parece ouvir o som do rugido de uma pantera. Assustada, ela começa a gritar. A câmera então nos mostra as paredes e o teto do lugar sem nunca mostrar nada concreto. Depois do susto, Irene surge como se nada tivesse ocorrido. 





Mesmo que nunca vemos Irene se transformando em uma pantera e apenas relances do animal, “Sangue de Pantera” alcança sua atmosfera de medo, com sombras, sons offscreen e com as reações dos personagens. Ainda que pareça quase certo de que a personagem realmente esteja amaldiçoada, há espaço para outras interpretações. Ainda assim podemos entender que a pantera pode ser entendida como uma metáfora no que diz respeito a uma forma que a protagonista encontra de pôr para fora sua raiva e ciúmes, situação essa que sempre fez com que Irene estivesse ciente de sua fúria e por consequência disso tivesse receio de se relacionar com as pessoas.  
     









terça-feira, 4 de abril de 2017

Enter Nowhere

Texto de : Tarcísio Paulo Dos Santos Araújo

Sempre bom poder descobrir e conferir filmes que muitas vezes passam completamente batidos. “Enter Nowhere” é um desses filmes. Exibido na Netflix dos Estados Unidos, o longa produzido em 2011 e dirigido por Jack Heller, que atua mais como produtor do que como diretor, bem que poderia ter sido exibido no catálogo da Netflix do Brasil.


Depois de um assalto (que termina com a morte do caixa) realizado por Jody (Sara Paxton) e seu namorado, Kevin (Christopher Denham), em um pequeno mercado, somos imediatamente levados para outra ambientação. A sensação de liberdade e a juventude, exaltadas o início do filme com uma fotografia que opta por tons mais quentes ao nos apresentar Jody, são tomadas por uma mulher que perambula por uma floresta com galhos tortos e uma fotografia em tons frios e acinzentados. Agora conhecemos Samantha (Katherine Waterston), uma mulher que resolve ir atrás do marido que a deixou dentro do carro para procurar ajuda depois que o veículo quebrou. 



Ao encontrar uma velha cabana na floresta, a mulher descobre que Tom (Scott Eastwood, filho de Clint Eastwood) habita o lugar há alguns dias depois de também ter tido problemas com o seu carro, que caiu numa vala. Depois de tentarem andar pelas redondezas, sem encontrar ajuda, não demora muito para Jody se una a Samantha e Tom. A partir daí coisas entranhas começam a serem descobertas pelos três personagens, incluindo um misterioso homem que anda pela floresta com uma arma na mão.


“Enter Nowhere” traz uma pitada de ficção científica (lembrando um episódio de “Além da Imaginação”) na sua resolução final, mas sem antes deixar de criar um ambiente que preza uma atmosfera carregada de mistério e incertezas. Sem entregar o final, o tema principal da narrativa é a possibilidade de tentar mudar o futuro e consequentemente nossos erros. Mesmo com o ponto de vista de Jody, percebemos aos poucos como a vida dos personagens carregam equívocos que mudaram suas vidas drasticamente. O próprio lugar onde o filme se passa, pode ser entendido como uma espécie de purgatório para esses personagens, embora eles não estejam exatamente mortos.

Muito pode ser entendido como pista para compreender o que está acontecendo, na forma como cada personagem age e até pela forma de se vestir. Cada ator incorpora bem seu personagem, defendendo o jeito de ser de acordo com o que cada um vive e acredita.

Como um filme de baixo orçamento, isso infelizmente fica um pouco escancarado nos efeitos visuais, mas acredito que o roteiro consistente (embora alguns detalhes não fiquem cem por cento claros, talvez propositalmente para que o espectador crie suas próprias conclusões) e a atmosfera criada são o suficiente para prender, principalmente para quem gosta de boas histórias com uma boa atmosfera cheia de mistério muito potencial para entreter.  




Erotismo e a cidade: Vidas nuas (1967) de Ody Fraga

  O aspecto mais interessante em Vidas nuas é a fluidez como a cidade de São Paulo é filmada, desde seu primeiro plano quando temos acesso ...