Com
boa premissa, filme promete um show de suspense e tensão
Texto de: Tarcísio Paulo Dos Santos Araújo
Muito elogiado pela
crítica, que já o considera um dos melhores filmes de terror do ano até o
momento, Um Lugar
Silencioso (A Quiet Place,
2018) chamou a atenção de ninguém menos que Stephen King. O escritor elogiou a
atuação e a fotografia do longa, acrescentando ao dizer que o filme “é um
trabalho extraordinário”. Algo também apontado por King foi o silêncio. Sim,
boa parte desse sucesso se deve a premissa curiosa e desafiadora envolvendo o
som como algo ameaçador.
Em um universo
pós-apocalíptico, o casal Lee Abbott (John Krasinski, que também dirige o filme)
e Evelyn Abbott (Emily Blunt) vivem numa
fazenda do interior dos EUA com os filhos Marcus (Noah Jupe), Beau (Cade Woodward) e a filha Regan (Millicent
Simmonds), que é deficiente auditiva. O ano é 2020 e elementos vão aos poucos
revelando que possivelmente alguma invasão alienígena dizimou uma grande parte
da humanidade, restando poucos sobreviventes. As criaturas que agora vivem na
Terra, são cegas, mas apresentam uma audição extremamente apurada, fazendo com que
qualquer som emitido por algo ou por alguém, chame a atenção delas e inicie uma
caçada fatal até a pessoa ou coisa que tenha gerado o ruído.
O grande trunfo de Um Lugar
Silencioso está na sua capacidade de exercitar o gênero do suspense de
forma muito eficaz ao manter o espectador sempre alerta. Não o bastante, ainda
tem o terror que está bem equilibrado junto com esse suspense e a tensão.
Lembrando que falamos do real suspense, aquele que nos fornece informações
importantes na história e que mais para frente trarão conflitos para os
personagens, porém os mesmos não estão cientes disso. Cito isso porque é comum
uma confusão com a surpresa, que é quando o espectador é pego de surpresa junto
com o personagem. Isso também está presente no
filme, principalmente com alguns jump
scares, mas que são facilmente perdoados quando fazemos um balanço do longa
como um todo.
Algo que seria impossível
não comentar, é o poder do som (e de sua falta) no filme. Com a sinopse citada
acima, o roteiro coloca o espectador em alerta constante. Um som diegético
(aquele que faz parte da cena) como uma música romântica ouvida por Evelyn
enquanto usa fone de ouvido, passa a ser ouvidos por nós no momento em que ela
coloca os fones em Lee. A cena marca a sintonia e o amor entre o casal (e
consequentemente nossa empatia), que dança enquanto ouve a canção. Já a música
extra-diegética (que é aquela que apenas nós ouvimos) aparece pontuando os
momentos certos, principalmente os de perigo eminente, como se nesse instante a
música que ao mesmo tempo em que cria a tensão para cena, reforça a presença
das criaturas.
Ficamos
em uma zona mais ou menos confortável quando tudo está em silêncio e nos
assustamos com um barulho que potencializa nosso temor e consequentemente nossa
preocupação com os personagens quando sabemos que o ruído irá implicar na
aparição dos monstros.
Falando em personagens, a
química entre os atores é muito boa e facilmente abraçamos essa família e
torcemos por cada um deles. Com tanto foco nas ações e na sobrevivência, ainda
há espaço para um bom desenvolvimento desses personagens. Depois de um
incidente que ocorre logo no início do filme, mas que não será revelado aqui,
cria-se uma culpa em Regan e consequentemente faz com que seu pai, Lee, evite
que a menina saia de casa para evitar que algo ocorra até com ela mesma. Mesmo
se mostrando bem madura e disposta a enfrentar qualquer coisa, Lee não escuta a
menina. Cabe então a Marcus acompanhar o pai pela mata até o rio para pegar
peixe e ao mesmo tempo ficar exposto a qualquer deslize que possa pôr em risco
sua vida. Claro que essas questões, logo serão resolvidas ao longo do filme,
com direito a cenas bem emocionantes e que também falam de questões como a
proteção dos filhos e como os pais se esforçam para garanti-la.
É mesmo muito louvável o
trabalho de Krasinski no filme, que além de atuar e dirigir, foi um dos
roteiristas e o produtor executivo. O domínio tanto do roteiro quanto da
direção, tem tudo para prometer outros trabalhos também significativos. O
cineasta que curiosamente não cresceu vendo filmes de terror, disse que longas
recentes como Corra (2017) e O Homem nas Trevas (2016), estavam
inclusos em suas pesquisas enquanto se preparava para o seu filme. Kransinski
citou Um Lugar Silencioso como
metáfora para a paternidade e até mesmo a atual situação política dos EUA,
dizendo que “podemos enfiar a cabeça em um buraco ou tentar se envolver no que
está acontecendo”. Seguindo essa linha de pensamento, o longa serviria até para
nosso atual momento na política, não é mesmo? Mas também pode-se refletir, pensando
agora na paternidade, o preparo que os pai dão aos filhos para que eles
enfrentem a vida. Será que ficar no silêncio e evitar constantemente o som (que
pode ser visto como os conflitos da vida), é algo que fortalece as pessoas e as
prepara para enfrentar o mundo?
Um
Lugar Silencioso tem tudo para entrar na lista dos filmes
de terror que nos últimos anos têm se destacado, seja pela crítica social mais
latente ou simplesmente pelo domínio de direção e de roteiro, que consegue dar
novas e boas possibilidades de se fazer algo que ofereça um frescor para o
público, principalmente depois de praticamente tudo já ter sido feito.