Thirteen Reasons Why o Livro e a Série para além das polêmicas e suas críticas sociais
A série “13 reasons why”, Os 13 Porquês, aqui no brasil
lançada no final de março desse ano 2017 pela Netflix, gerou muita polêmica e
burburinho na internet, despertando tanto curiosidade, como debates acalorados
a respeito de suicídio, tema ainda considerado um tabu em nossa sociedade, e
sem muito espaço para debates mais aprofundados, principalmente entre os jovens. A série é baseada
no livro homônimo escrito por Jay Asher, e antes de virar atração seriada de
forte repercussão, o livro já era um best-seller.
O blog simulacro chega um pouco atrasado para a discussão a
respeito da série e do livro, porém nunca é tarde para discutirmos sobre séries
e livros. Então lá vai uma breve análise crítica sobre ambos. Vamos tentar
discutir a respeito do livro e da série em um artigo único, comparando os dois,
mesmo que isso seja um tanto complicado, já que se tratem de mídias diferentes,
no entanto, vale a comparação aqui, para refletirmos um pouco sobre a narrativa
contida em Os 13 Porquês.
Partindo da premissa principal do livro, temos uma narrativa
um tanto peculiar, já que a história é narrada em primeira pessoa, porém
são dois narradores, o principal e protagonista da história, o adolescente de
17 anos Clay Jensen, que alguns dias depois da trágica morte por
suicídio, de uma garota de sua escola, recebe uma caixa de sapatos com 13 fitas
k7, nas quais continham os relatos da própria Hannah Baker, a garota que havia
tirado a própria vida, o que estava mexendo com a vida escolar de todos, e afetando ainda mais a Clay, que sempre foi apaixonado pela garota, mas nunca teve a coragem de se declarar.
A história tem um segundo narrador, que é a própria Hannah Baker, que assume o
controle da narrativa e evidencia a partir de seu ponto de vista o que a levou a cometer o
suicídio.
Ok temos outros livros com mais de um narrador em primeira
pessoa na história da literatura, e também temos livros com relatos de fitas
k7, fitas de vídeo, cartas e outras formas de relatos, e partindo dessa afirmação Os
13 Porquês, não teria nada de inovador. Porém não devemos parar por ai, pois
esse formato da a história cria uma dramaticidade e um ritmo que prende o leitor a
se aprofundar mais na história. Começamos a leitura sabendo que Hannah Baker
está morta, mas precisamos saber o porquê, e ter a sensação de ouvir as fitas
com Clay nos motiva a seguir a leitura.
Essa forma de narrativa adotada por Asher, ajuda a criar um
clima de suspense, mesmo sendo obvio o que aconteceu no final.
Acompanhar a jornada de Clay Jansen nos coloca quase que em sua posição, temos
uma narrativa intensa, em que o garoto nos conta sua versão dos fatos enquanto
ouve as versões de Hannah.
O livro não se aprofunda muito na construção dos
personagens, nem mesmo dos protagonistas, chegando a ser um tanto poético em alguns
trechos, sem deixar nada muito bem resolvido ou acabado. Vamos descobrindo aos
poucos que Hannah Baker sofria bullying na escola onde estudava, e as coisas vão
se agravando, até se tornarem insuportáveis.
A série Os 13 Porquês, tenta aproveitar algumas das lacunas
deixadas pelo livro, aprofundando-se mais na história dos personagens. Ouvimos
sempre dizer que quando um livro é adaptado para um filme ou série, ele acaba
perdendo um pouco de sua história, porém aqui o caso é bem o contrário, a série
acaba indo muito mais além do que o livro apresenta, o que por um lado é
interessante, ainda mais quando se trata de fãs ávidos por mais das histórias
que já conhecem e amam, como é o caso dessa geração pós moderna que costuma
consumir um mesmo conteúdo exaustivamente em diversas plataformas, e também se
levarmos em consideração que o livro é bem pouco descritivo, e nos deixa
abertos muitas interpretações.
Mas isso também pode ser interpretado como uma
forma de tentar explorar além da conta um determinado conteúdo. Como por
exemplo, no livro os adultos mal aparecem e quase toda a história se
desenrola em uma noite de angustia, enquanto Clay Jansen ouve as fitas de
Hannah Baker, atordoado, e sem poder fazer nada para reverter uma situação já
definida, mesmo que amasse a garota, infelizmente havia perdido sua
oportunidade de demonstrar enquanto ela ainda estava viva. Provavelmente esse
seria o tema principal do livro, o amor impossível e a perca de oportunidades
de se declarar. Temos a faceta de uma jovem angustiada que se revela em suas 13
fitas k7s, tentando fazer justiça a si própria, já que ninguém fizera por ela, o
que beira a quase uma tentativa de vingança, movida pelo desejo de que todos na
escola que a maltrataram de várias formas ficassem cientes do mal que a
causaram.
Na série as coisas se desenrolam com um tempo mais lento,
temos o mesmo formato de contato com a história, vamos descobrindo junto com o
protagonista por que seu nome estava em uma dessas fitas, e cada um dos treze
motivos que levaram Hannah Baker a cometer suicídio. Porém enquanto Clay ouve
as fitas acompanhamos também a repercussão que as fitas já haviam causado ao
serem ouvidas pelas outras pessoas que tinham seus nomes na lista dos 13
porquês de Hannah. O seriado elabora um
personagem para cada porquê, dando algum sentido para as atitudes tomadas pelos
garotos que estudavam com Hannah, já que no livro temos apenas breves
descrições de cada um, e relatos do que fizeram.
O livro apresenta a história quase que apenas pelas fitas
deixadas por Hannah Baker, temos basicamente apenas o seu lado da história, vemos
atletas, lideres de torcidas populares sendo cruéis com uma garota
novata e insegura de mais para reagir a insumos e boatos que inventaram a seu
respeito.
A série da um rosto para Justin Foley, Alex Standall, Jessica Davis, Tyler
Down, Courtney Crimsen, Marcus Cooley, Zach Dempsey, Ryan Shaver, Sheri Holland,
Bryce Walker e a senhor Portter. Todos
esses personagens ganham vida de fato, cada um ganha uma história também, e num
geral todos tem dramas com famílias disfuncional, ou sofrem com pressões da vida
escolar e da sociedade, o que no final das contas, torna tudo muito próximo de
todos, e de fácil identificação pelo público em geral. Mas também ajuda a compor o perfil de personagens agressivos.
O formato série tenta explorar mais as relações sociais como
a essência de problemas como a violência entre os jovens, o bullying e também o suicídio.
O que foi uma sacada até bem lógica e funcional para o formato, já que a
história teria que ser aprofundada para ser contada ao longo dos treze
episódios.
Como fenômeno social o que a série tenta passar acredito que seja o
que vale a pena para assisti-la, e discutimos sim sobre ela, é sempre necessário
discutirmos como nos comportamos e como isso afeta de forma direta os outro. O
que na época do lançamento da série na Netflix foi pouco ou nada discutido, já que as
polêmicas puxaram todos os assuntos para o fato de se podemos ou não falarmos sobre suicídio. E hoje alguns meses depois assistindo a série com
olhar critico percebo que a proposta de discussão aqui poderia ser mais rica,
como por exemplo toda vez que se fala em Bullying e em depressão as pessoas
fogem e são pouco abertas ao debate, e na maioria das vezes fazem vista grossa
para o que acontece.
Estamos acostumados com um formato de escola e de sociedade
que tenta colocar todos em um molde, esquecendo que cada um é único, e pode encarar a
vida de muitas formas diferentes. O embate entre os jovens na escola mostrado
na série poderia facilmente levantar uma questão que passou batida,
simplesmente pelo fato que estamos acostumados a tratar as pessoas ao nosso
redor mal, acreditando que está tudo bem e que não estamos ferindo ninguém,
somos uma sociedade egoísta e hipócrita que varremos nossos podres e segredos
para baixo do tapete, sempre que necessário, mesmo que isso possa atrapalhar a
vida de alguém. Criamos nossos filhos para esse sistema, de ser forte a todo
custo, de ser um vencedor a todo custo, mesmo que isso custe a vida dos outros,
ou seja apenas uma métrica imposta por uma sociedade falsamente moralista.
Naturalizamos o sofrimento alheio para aliviarmos nossas consciências e tentamos
nos defender encontrando o defeito dos outro.
Parece algo assustador para se escrever ou dizer, mas essa é
a verdade, todos somos agredidos todos os dias, e seguimos adiante é fácil perceber o quanto somos hostis uns
com os outro apenas dando uma passada de olho nas time lines das nossas redes
sociais. Mas quando temos a oportunidade de discutimos sobre nossa cultura de invisibilizar o outro, tomamos atitudes parecidas com a dos garotos que se
escondem de medo das responsabilidades na série, viramos para alguém e dizemos
apenas, “A essa série é muito polêmica”, ou “Não deveriam ficar falando de
suicídio com os jovens, isso é incentivar”, ou ouvimos coisas piores como o que é falado na série: "que a garota que se matou fez o que fez para chamar a atenção".
Talvez falar sobre suicídio seja ainda um tabu porque isso
exija que paremos para pensar e refletir, o que a muito a nossa sociedade não
faz, saímos falando ou escrevendo antes de pensar nas consequências, e quando se trata de assumirmos responsabilidades, somos ainda
piores.
A série tratou o assunto com delicadeza sem romantizar a
situação, o que é muito bom para a discussão saudável de assuntos polêmicos.
Outra questão levantada para a série é com relação a fragilidade da mulher na
sociedade, e de como ainda hoje cuidar de uma reputação impecável é muito
importante principalmente para mulheres, e que boatos inventados por garotos
para construir sua gloria humilhando publicamente uma garota ainda é prática
considerada normal, um fato que as meninas deveriam levar com naturalidade, um aspecto
que foi pouco falado na época de lançamento da série, mas que deveria ser discutido com atenção.
Tanto na leitura do livro quanto assistindo a série me veio
fortemente a cabeça um outro livro chamado “Nada” da escritora Janne Teller, que recomendo fortemente,
principalmente se você assistiu a série e leu o livro. Em "Nada" temos uma turma
de estudante ainda mais jovem que ao se deparem com um aluno que se recusa descer de uma arvore por acreditar que a vida não fazia sentido, começam a
fazer de tudo para provar ao garoto o verdadeiro valor da vida, porém essa
tentativa dos meninos vai aos poucos os consumindo, chegando a extremos que eles não previam.
A série acabou se aproximando ainda mais desse sentido
apresentado no livro “Nada”, ao mostrar o embate dos estudantes com suas
responsabilidades, consciência e desejos.
O filme “A Mentira” de Will Gluck (2010), trabalha com tema
semelhante, ao abordar a vida de uma colegial, que vitima de boatos a seu
respeito acaba perdendo o respeito dos garotos da escola se tornando excluída e
desprezada até mesmo pelas garotas.
Nesse caso temos um filme mais leve onde tudo acaba se
resolvendo bem, mas ainda assim percebemos o quanto é difícil se afirmar
socialmente e o quanto os adultos que poderiam ajudar, por vezes acabam se ausentando
dessas situações, pois levam tudo com naturalidade, como uma fase, sem
esperarem que algo pode realmente dar errado seriamente.
A série acaba colocando os pais das personagens na história, nos comovemos com o sofrimento dos pais de Hannah Baker, o que ajuda a passar uma mensagem de conscientização a pessoas que possam estar enfrentando os mesmos problema que Hannah passou na série, mostrando um caminho que poderiam tentar se abrindo com os pais, ou pessoas que possam oferecer algum tipo de ajuda, antes de chegar a decisões extremas.
No livro essa ideia se dá pela possibilidade que Hannah teria se tivesse conseguido falar com o Clay. Ou seja nenhum dos dois aborda o suicídio como saída para problemas, e sim nos coloca na perspectiva de possibilidades que ficam em aberto se não tentarmos. E ainda nos alerta para a deficiência que temos em ajudar pessoas que são vitimas de violência, ou que sejam de grupos de risco.
Os 13 porquês deve ser visto, ou lido por uns treze porquês diferentes, mas talvez um dos mais importantes seja para podermos olhar para nós mesmos, e pensar porque ainda não somos uma sociedade capaz de funcionar bem para todos.
No livro essa ideia se dá pela possibilidade que Hannah teria se tivesse conseguido falar com o Clay. Ou seja nenhum dos dois aborda o suicídio como saída para problemas, e sim nos coloca na perspectiva de possibilidades que ficam em aberto se não tentarmos. E ainda nos alerta para a deficiência que temos em ajudar pessoas que são vitimas de violência, ou que sejam de grupos de risco.
Os 13 porquês deve ser visto, ou lido por uns treze porquês diferentes, mas talvez um dos mais importantes seja para podermos olhar para nós mesmos, e pensar porque ainda não somos uma sociedade capaz de funcionar bem para todos.
Tecnicamente a série é boa, conta com uma trilha sonora
forte com músicas que ajudam a compor muito bem todas as situações, temos cenas
fortes e complicadas defendidas com mérito para o elenco, destaque para a
protagonista Hannah Baker vivida pela atriz katherine langford.
A fotografia é muito bonita, e ajudam a dar um
ritmo fluido e sentimental a narrativa a série. Um aspecto da montagem é que ela se aproxima do suspense e por vezes se aproxima dos thrillers para jovens que fizeram muito sucessos no final dos anos 1990 e inicio dos anos 2000, como a série "Pânico"(1996), e "Eu Sei o que Vocês Fizeram no Verão Passado" (1997).
talvez a maior falha da série tenha sido estender de mais a história, ainda que para sua pretensão de aprofundar os personagens funcione, porém soou um pouco exagerado, ainda mais pensando em uma possível sequência, o que já sabemos que acontecerá, e nesse caso a série rompe completamente com o livro, já que tudo que poderia ser adaptado do livro já foi na primeira temporada, por isso os roteiristas terão muito trabalho, para não perderem a mão.
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Eu Sei o que Vocês Fizeram no Verão Passado |
talvez a maior falha da série tenha sido estender de mais a história, ainda que para sua pretensão de aprofundar os personagens funcione, porém soou um pouco exagerado, ainda mais pensando em uma possível sequência, o que já sabemos que acontecerá, e nesse caso a série rompe completamente com o livro, já que tudo que poderia ser adaptado do livro já foi na primeira temporada, por isso os roteiristas terão muito trabalho, para não perderem a mão.